Escusa
de Consciência
Por
Levi de Paula
PALAVRAS-CHAVE:
DIREITOS,
CONSTITUIÇÃO, ESCUSA DE CONSCIÊNCIA,
OBRIGAÇÃO, ESTADO CRENÇA
RELIGIOSA, CRENÇA FILOSÓFICA, CRENÇA POLÍTICA.
Introdução
O objetivo deste
artigo é demonstrar como a Constituição Brasileira transmite segurança aos
direitos fundamentais de alguns cidadãos que, em algum momento, por algumas
razões inerentes às suas convicções religiosas, filosóficas ou políticas, vão
se opor à obrigação a todos impostas.
Se a Constituição diz
que o Brasil é um Estado laico e que é garantida a proteção aos locais de culto
e suas liturgias, que é garantida a liberdade de consciência e de crença, esta
por sua vez, também garantirá a escusa de consciência a respeito de obrigações
que contradizem estas convicções.
Veremos no texto a
seguir pontos relevantes a respeito de tal instituto.
Capítulo
1: Conceito
A CF/88 proclama, em seu art. 5º, inciso VIII que
"ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de
obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa,
fixada em lei".
Escusa significa desculpa, justificação, escusa de consciência
significa então, objeção de consciência, quer seja por motivo religioso,
filosófico ou político.
Mas o que quer dizer o artigo 5º, inciso VIII da
nossa Constituição de 1988? Que qualquer pessoa que alegar motivos religioso,
filosófico ou político não pode ser privada de direitos. Porém, caso esta
pessoa invoque estes motivos para eximir-se de obrigações legais a todos
impostas e ainda recusar-se a cumprir prestação alternativa fixada em Lei pode
ter suspensos seus direitos políticos.
O artigo 5º, inciso VIII da CF/88 dá direito ao
indivíduo de ter livre arbítrio com relação às suas crenças religiosas,
filosóficas ou políticas. A escusa de consciência concede ao cidadão uma
abstenção com relação a algumas obrigações, permitindo-lhe não cumpri-las. E
ninguém pode violar este direito concedido pela Constituição, nem mesmo o
Estado.
Contudo, não basta ao indivíduo esquivar-se de
cumprir certas obrigações que suas crenças proíbam; pode eximir-se, porém, deve
cumprir prestação alternativa fixada em Lei. Destarte, o indivíduo pode viver
sua vida conforme dispõe sua crença religiosa, convicção filosófica ou
política, no entanto, sem ferir direitos de terceiros.
Mas quais seriam estes motivos elencados pelo
artigo 5º, inciso VIII da CF/88 pelos quais alguém pode se livrar de obrigações
impostas a todos pelo Estado? Alguns casos são: objeção às vacinas, aos testes
de sangue, à doação de órgãos, à concepção, ao aborto, ao tratamento médico, ao
trabalho aos sábados, ao serviço militar. Alguns destes casos pormenorizaremos
mais a frente.
Capítulo 2: Perda ou suspensão dos direitos
políticos?
Como já comentado acima, a escusa de consciência
não é motivo de perda dos direitos políticos, mas de suspensão destes. É bem
verdade que se há obrigações a todos impostas que o indivíduo por seus motivos
de crença religiosa, filosófica ou política não as vai cumprir, deve existir
uma prestação alternativa fixada em Lei que também não poderá cumprir para que
tenha seus direitos políticos suspensos.
A interpretação que nos permite saber sobre que
tipo de privação de direitos os descumpridores das obrigações terão não está
inserida no inciso VIII, do artigo 5º. Temos esta resposta no artigo 15 da CF:
Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado;II - incapacidade civil absoluta;III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII;V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.Contudo, ainda assim não é clara a leitura sobre se a punição é perda ou suspensão dos direitos políticos, ficando nas mãos dos doutrinadores o poder de decisão nas suas interpretações. Muitos divergem em suas interpretações, porém, esta dúvida se esgota quando lemos o artigo 438 da Lei nº 11.689/2008(CPP):“A recusa ao serviço do júri fundada em convicção religiosa, filosófica ou política importará no dever de prestar serviço alternativo, sob pena de suspensão dos direitos políticos, enquanto não prestar o serviço imposto.§ 1o Entende-se por serviço alternativo o exercício de atividades de caráter administrativo, assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, no Poder Judiciário, na Defensoria Pública, no Ministério Público ou em entidade conveniada para esses fins.§ 2o O juiz fixará o serviço alternativo atendendo aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.”
Portanto, suspendem-se os direitos políticos
de alguém até que cumpra prestação alternativa, em lugar de obrigação a todos
imposta, a qual não vai cumprir por causa de suas convicções religiosas,
filosóficas ou políticas. Cumprida a obrigação ou sua prestação alternativa, restaura - se
seus direitos políticos; estamos, portanto, falando de suspensão e não de perda
dos direitos políticos.
Capítulo
3: Das classificações
Objeção de
consciência ao serviço militar
A Lei 4375 de
17/08/1964 diz que “todos os brasileiros são obrigados ao Serviço Militar, na
forma da presente Lei e sua regulamentação.”
Dispõe basicamente
acerca do recrutamento e a atividade militar. Todos os brasileiros de sexo
masculino são obrigados a prestar este serviço. Porém, muitas religiões não
permitem que seus membros lutem ou matem por quaisquer motivos que sejam;
usa-se, portanto a escusa de consciência para eximir-se desta obrigação, não
esquecendo, contudo que existe uma prestação fixada em Lei, a Constituição
Federal afirma que “às Forças
Armadas compete, na forma da lei, atribuir serviço alternativo aos que, em
tempo de paz, após alistados, alegarem imperativo de consciência, entendendo-se
como tal o decorrente de crença religiosa e de convicção filosófica ou
política, para se eximirem de atividades de caráter essencialmente
militar”.(artigo 143, § 1º)
Objeção de
Consciência religiosa
Com base neste
direito, muitos religiosos podem eximir-se do ato cívico, que é o ato de votar
em certos dias e horários. Alguns também usam este direito para recusarem
doação de sangue, mesmo em casos extremos, é o caso das Testemunhas de Jeová, afirmam
que o único doador de sangue, que é a vida, foi Jesus Cristo e que ninguém,
jamais poderá se igualar a ele, então, com base neste direito, escusam - se de
tal obrigação, que é a obrigação de ser tratado para que lhe seja preservada a
vida.
Objeção de consciência
ao aborto
Os profissionais de saúde ou
hospitais podem se recusar a realização de abortos por razões morais, não
demonstrando assim discriminação pelo uso desse direito. Porém, se o aborto for
necessário, uma vez que, pode salvar a vida da gestante, o profissional é
obrigado a realizar o procedimento, sob pena de ser punido por omissão de
socorro, previsto no art. 128, I, e 135, do Código Penal Brasileiro.
Objeção de Consciência ao
trabalho nos sábados.
Para os Adventistas do 7º
dia, o sábado é um dia sagrado e santificado, pois foi o dia em que Deus
descansou e ao sábado santificou e deixou para seu povo a ordem de neste dia
não trabalharem. O sábado começa no por do sol da sexta feira e vai até o por
do sol do sábado, que é quando para eles tem início o domingo.
Este direito é usado muito
frequentemente pelos que trabalham em empresas que exigem trabalho aos sábados.
Neste caso, a empresa permite que os funcionários cumpram seus trabalhos de
sábado em outros dias, por exemplo, podem estender-se por mais de 8 horas
diárias de serviço, levando em conta não trabalharem no sábado.
Outro caso muito comum é a
prestação do ENEM pelos estudantes adventistas do 7º dia. Eles devem chegar ao
mesmo horário fixado para todos, porém, ficam confinados desde o início das
provas até o por do sol em uma sala reservada para que, somente então, possam
iniciar suas provas, após o sábado. Esta longa e causticante espera seriam a
prestação alternativa.
Considerações finais:
Deve-se lembrar que nosso País é um Estado
Laico, tendo por parte o desmembramento do Estado e Igreja, com base, por
exemplo, nos artigos 5º, inciso VI, e 19, inciso I, ambos da Constituição
Federal. Sendo assim, a objeção de consciência deve ser associada ao respeito
que o Estado brasileiro devota à crença religiosa de cada indivíduo, assim como
à sua convicção filosófica ou política.
A escusa de consciência acontece, portanto,
quando alguém invoca a sua convicção pessoal para não cumprir uma obrigação
imposta a todos, devendo então cumprir uma prestação alternativa, fixada em
lei.
Referências:
Constituição Federal de 1988, Lei nº 11.689/2008(CPP), Lei 4375 de 17/08/1964.